sábado, 26 de julho de 2008

Língua declarada

Fecharam-se as portas da 7ª Conferência de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Países de Língua Portuguesa – CPLP (Lisboa, Portugal, Julho de 2008). Ficam várias declarações e promessas.

Com a “DECLARAÇÃO SOBRE A LÍNGUA PORTUGUESA” (Lisboa, 25 de Julho de 2008) a Conferência de Chefes de Estado e de Governo, composta por Brasil (Lula da Silva), Cabo Verde (Pedro Pires), Guiné-Bissau ("Nino" Vieira), Portugal (Cavaco Silva), São Tomé e Príncipe (Fradique de Menezes), Timor-Leste (Ramos-Horta), o primeiro-ministro de Angola (Fernando da Piedade “Nandó”) e ainda o ministro dos Negócios Estrangeiros de Moçambique (Oldemiro Balói), os membros da CPLP acordaram:

A sua actuação conjunta no processo de efectiva mundialização da Língua Portuguesa, nomeadamente, através:

a. Do apoio à introdução da Língua Portuguesa em Organizações internacionais, regionais ou agências especializadas, bem como à sua utilização efectiva em todas aquelas Organizações onde o Português já constitui língua oficial ou de trabalho;
[Que é como quem diz: assegurar que o Português se torna numa língua de trabalho na Organização das Nações Unidas, na União Europeia, na União Africana e no Mercosul, dominadas pelo Inglês, Francês e Castelhano. Boa sorte!]

b. Da coordenação de esforços na formação de tradutores e intérpretes e implementação de tecnologias da informação e comunicação ao serviço da tradução e interpretação;

[Que é como quem diz: desenvolver programas de computador para tradução automática. Será necessário competir com os gigantes Babylon e Systran. Uma boa ideia seria criar um programa de código aberto, que recolha o contributo de voluntários os vários países da CPLP, nomeadamente os talentos que se escondem nas Universidades.]

c. Da concertação de programas comuns para o Ensino do Português como Língua Estrangeira, com a criação de uma rede de professores certificados dos Estados-Membros da CPLP e a difusão dos sistemas de certificação do Português como Língua Estrangeira;
[Que é como quem diz: cada país da CPLP envia actualmente de modo autónomo para a China ou para a África do Sul os seus próprios professores, que leccionam de acordo com o programa do seu país de origem. Isto gera incoerências no ensino da Língua. É uma boa ideia, mas que deixo aos professores para comentarem.]

E ainda:

O seu compromisso na concertação de programas que promovam, na cena internacional, o valor cultural e económico do Português, designadamente através de projectos comuns suportados pelas tecnologias de informação e comunicação.
[Que é como quem diz: a CPLP acordou agora para uma realidade que o Brasil já tinha vislumbrado há algum tempo – se o Português for uma língua conhecida internacionalmente, haverá um maior interesse pela literatura lusófona (ganham os autores e os editores), pelo cinema lusófono (ganham os actores, argumentistas, realizadores, técnicos,…), pelos programas informáticos lusófonos (ganham os programadores, as empresas de informática,…). Uma boa ideia seria a criação de uma biblioteca digital poderosa, tema a que voltaremos mais tarde.]

E mais:

O seu regozijo pela futura entrada em vigor do Acordo Ortográfico, reiterando o compromisso de todos os Estados membros no estabelecimento de mecanismos de cooperação, com vista a partilhar metodologias para a sua aplicação prática.
[Que é como quem diz: a CPLP regozija-se por um Acordo Ortográfico que, espera, está prestes a entrar em vigor. Isto apesar de a maioria dos países não ter procedido aos instrumentos de ratificação necessários e de a CPLP pouco ter feito por isso. Em Portugal, um grupo significativo de cidadãos organiza petições e protestos contra o que considera ser uma rendição à forma de escrever brasileira. Não há muitos motivos para regozijo…]

Sem esquecer:

A necessidade de medidas concretas relativamente ao compromisso da desejável unificação do vocabulário científico e técnico em Língua Portuguesa.
[Que é como quem diz: evitar que o Brasil incorpore anglicismos como escaner, acessar e mídia, enquanto Portugal se preocupa em manter vocábulos com digitalizador, aceder e media. Já para não falar nos hormônios e hormonas. Com o surgimento em catadupa de novas tecnologias, nomeadamente ligadas à informática, e o predomínio da cultura anglo-saxónica, cada autor e cada país tem traduzido manuais de utilizador, programas de computador e tutoriais como muito bem entende, sem se preocupar com o que se faz do outro lado do Atlântico. O que uns qualificam de diversidade linguística, eu qualifico de confusão descabida, que baralha os aprendizes da língua, retira uniformidade à produção científica e a torna desconexa para investigadores e utilizadores comuns.]


Já com a “RESOLUÇÃO SOBRE O INSTITUTO INTERNACIONAL DA LÍNGUA PORTUGUESA” (Lisboa, 24 de Julho de 2008), o Conselho de Ministros da CPLP decidiu:

1. Recomendar ao Comité de Concertação Permanente para, em estreita colaboração com o IILP, proceder a uma profunda reavaliação do funcionamento do IILP, nomeadamente da adequação dos instrumentos jurídicos existentes e da estrutura, financeira e de recursos humanos, em função dos seus objectivos, para apresentação ao XIV Conselho de Ministros [em 2009];
[Que é como quem diz: o Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), com sede em Praia, Cabo Verde, é a instituição da CPLP que tem como objectivos a planificação e execução de programas de promoção, defesa, enriquecimento e difusão da Língua Portuguesa. Em 2008, funcionou com um orçamento de 183.230 Euros, fornecido directamente pelos países da CPLP em diferentes proporções. Uma verba irrisória, indigna de um Instituto com a sua missão. Muito gostaria de dar mais informações sobre o IILP, mas a navegação na sua página na Internet é impraticável…]
2. Encorajar o IILP a prosseguir na elaboração do Plano Estratégico para a Gestão Internacional da Língua Portuguesa, instando, igualmente os Estados membros a conferir um maior envolvimento do IILP na elaboração e execução das suas políticas de língua;
[Que é como quem diz: ao Instituto Internacional da Língua Portuguesa ficará entregue a missão de apresentar uma proposta estratégica mundial para o Português. Como se articulará a sua estratégia com a dos organismos nacionais? Nomeadamente numa altura em que se pensa numa reestruturação profunda do Instituto Camões.]

E com “RESOLUÇÃO SOBRE A CIRCULAÇÃO DE BENS CULTURAIS” (Lisboa, 24 de Julho de 2008) o Conselho de Ministros da CPLP decidiu:

Recomendar à Reunião de Ministros da Cultura da CPLP, em estreita coordenação com os serviços nacionais competentes, a negociação, até à VIII Conferência de Chefes de Estado e de Governo [em 2010], de um acordo, com base nos acordos actualmente vigentes nos respectivos espaços de integração regional, que estabeleça normas e critérios definidos para a facilitação da circulação de bens culturais produzidos por cidadãos dos Estados membros, possibilitando assim uma maior integração cultural entre os seus povos.
[Que é como quem diz: devem ser facilitados os processos de concessão de vistos a artistas lusófonos que se pretendam deslocar a outros países da Comunidade, bem como as burocracias alfandegárias na entrada de objectos de arte, equipamentos musicais, cenários,…]

Mais tarde deixarei algumas breves reflexões...

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